top of page
Klaus Scarmeloto

Judiciário e democracia:o Estado Liberal em comparação com os Tribunais Populares Eletivos

Por Hermes Antônio Peixoto Junior

“Na Rússia, o aparelho do funcionalismo foi, pelo contrário, totalmente despedaçado. Dele não se deixou pedra sobre pedra.
Os velhos juízes foram expulsos, o Parlamento Burguês, desbaratado.
E, precisamente os trabalhadores e camponeses obtiveram uma representação muito mais acessível.
Através de seus Soviets, os funcionários foram substituídos, os seus Soviets foram colocados acima dos funcionários, por seus Soviets os juízes são eleitos.
Apenas esse fato basta para que todas as classes oprimidas reconheçam que o poder soviético, a forma dada à ditadura do proletariado, é milhões de vezes mais democrática que a república democrática-burguesa.”
Lênin – A Revolução Proletária e o Renegado Kaustky. 1918. Título: Democracia Burguesa e Proletária. Vol. XXVIII, p. 248.

RESUMO

  • Esta monografia visa provocar uma reflexão sobre o Poder Judiciário do Estado Liberal Democrático por meio de uma abordagem bibliográfica em que são destacadas as diferenças entre o modelo de justiça verificado nas democracias modernas e o propiciado pelos tribunais populares eletivos da Revolução de Outubro de 1917. O objetivo geral é elucidar o papel do judiciário no sentimento de impunidade tão comum em quem vive sob o sistema jurídico-institucional burguês de aplicação da justiça. Para isso, este trabalho se propõe a investigar como foi consolidada a estrutura do Poder Judiciário até seu contexto atual, conduzindo a uma análise cronológica de adventos históricos; aborda como teóricos clássicos pensaram e criaram o embrião do poder como hoje se conhece; versa sobre o chamado ativismo judicial e outras falhas do poder consideradas temerárias à real democracia; e trata de como os tribunais populares, em meio ao calor revolucionário, desconstruíram ideias da burocracia caras aos judiciário, como o grau de autoridade e a autonomia. Os principais autores referenciados são Emil Asturig Von München, Karl Marx, Friederich Engels, Vladimir Lênin, Robert Dahl, Michel Foucault, dentre outros. Dessa forma se apresenta um modelo alternativo plausível que buscou solucionar as contradições sociais sob a ótica das massas populares, tendo elas como legítimas detentoras de poder político, econômico e social.

  • Palavras-chave: Poder Judiciário. Dualidade do Ativismo Judicial. Estado na concepção marxista. Tribunais Populares Eletivos.

1 INTRODUÇÃO

  • Esta pesquisa convida a uma reflexão sobre o atual sistema jurídico republicano. No cotidiano do senso comum, o tema hoje suscita uma indagação: “quem não tem motivos para reclamar da justiça?”. Além das contradições que cercam questões individuais, trata-se de um problema que engloba ambiente político e econômico, bem como sugere um conluio entre autoridades judiciárias e agentes da segurança pública, em especial no abuso dos instrumentos de coerção estatal (funcionalismo e exército permanente) contra populações carentes. Em suma: séculos depois do surgimento das repúblicas modernas, os três poderes nunca estiveram tão bem alinhados em aprovar leis, executar leis, e principalmente, jurisdicionar sobre as leis, mas restam dúvidas sobre em prol de quais interesses o sistema se mantém em funcionamento. A aludida crise do regime democrático liberal nas social-democracias e até nas periferias de capital primário reflete a crise do capitalismo pelo mundo e desvela a incisividade do uso de mecanismos normativos contra grupos determinados, principalmente a classe trabalhadora e os oprimidos.

  • Em contraposição a essa perspectiva de sociedade atual, será abordada uma alternativa, a chamada justiça popular. O objetivo é abordar um modelo alternativo de se realizar justiça (ou de chegar o mais próximo possível dela).

  • As questões a serem perquiridas: como funciona o aparelho de opressão estatal contra os trabalhadores na figura de cidadãos constituídos de direitos? Qual a sua legitimidade para impor ao trabalhador, ao cidadão civil, a lógica de justiça embasada na normatividade e nos aparelho de repressão estatal?

  • Para isso, a ideia desta pesquisa é percorrer a natureza histórica do Poder Judiciário e dissertar sobre os modelos de tribunais populares eletivos concretizados pelas revoluções proletárias na Europa. A estrutura deste trabalho é a seguinte: aborda-se a história do Poder Judiciário e seus precursores, investigando o motivo de sua legitimidade, e sua natureza de classe; na sequência, demonstram-se as experiências das revoluções proletárias na prática, com um recorte nas formas desenvolvidas de administração de um novo modelo de justiça; depois, arrolam-se posicionamentos de estudiosos sob a concepção da justiça popular.

  • O método de pesquisa científica tem fundamento em elementos bibliográficos qualitativos que deram suporte para reverberar as problemáticas, bem como suas hipóteses verificáveis. Tendo como direcionamento livros, artigos, ensaios de autores renomados em suas respectivas áreas científicas.

  • Nesse sentido, seguem-se dessa forma os capítulos, na sequência desta introdução: 1) A perspectiva histórica e cronológica do Poder Judiciário e suas circunstancialidades, que se inicia na Antiguidade e percorre a Idade Média até os surgimentos dos Estados burgueses e das sociedades contemporâneas; 2) As questões do Estado de Direito e suas contradições com a democracia, e o modus operandi do Judiciário Burguês relacionado ao ativismo judicial e suas consequências; 3) O Estado na concepção marxista, o modelo pós-revolução proletária que visa conduzir um novo paradigma de sociedade com aspirações teóricas práticas fundamentadas no materialismo dialético científico de Karl Marx tendo como escopo, os experimentos factuais da Comuna de Paris, e os Tribunais Populares Eletivos da Revolução de Outubro de 1917, além de uma crítica paralela entre o modelo transicional capitalista para a socialista, e a justiça popular aplicada num plano espacial (análise foucaultiana).

  • Espera-se que essa revisão contribua na desmistificação do problema da pesquisa, que parece apontar para a compreensão de que o motor da desigualdade da sociedade moderna consiste na divisão de classes, bem como no entendimento sobre a estrutura e a superestrutura hierárquica da qual faz parte o Judiciário.


2 PERSPECTIVA HISTÓRICA DO PODER JUDICIÁRIO

  • München (2000) compreende que o Poder Judiciário sofreu diversas modulações históricas a ponto de se tornar um membro orgânico imprescindível do Estado de Direito, fundado no plano jurídico-institucional burguês.

  • Nesse sentido, o instituto provedor da justiça ganha relevância quando assume caráter de mecanismo substancial da chamada Teoria da Tripartição de Poderes de Charles de Montesquieu (MÜNCHEN, 2000).

  • Para compreensão dessa teoria, München (2000) afirma ser necessária a abordagem de dois cenários em que ocorre deterioração da democracia mesmo na forma de Estado Burguês: em tempos de estabilidade, o Estado visa garantir harmonicamente a extração econômica, a influência ideológica sobre a classe trabalhadora e os demais oprimidos, se necessário com o uso da repressão estatal, por meio da polícia, prisões, coerções, institutos penais, exército permanente, dentre outros; já em tempos de instabilidade, os demais institutos de autoridade jurídicoinstitucional tendem a abalroar na concorrência do processo de exploração da classe trabalhadora e dos oprimidos.

  • Para se chegar nesse nível de funcionalismo institucional, cabe uma breve introdução sobre a teoria da tripartição de poderes.


2.1 A CRIAÇÃO DA TEORIA DA TRIPARTIÇÃO DE PODERES

  • A teoria surge nos primeiros experimentos dos intelectuais da Antiguidade, sob a concepção aristocrático-escravista, na medida em que Platão, em sua análise do Estado, tentou desenvolver duas formas de imposição de classe: a dos proprietários latifundiários, e a dos representantes da monarquia (MÜNCHEN, 2000).

  • München (2000) afirma que Aristóteles descreve as três grandezas fundamentais que caracterizam a origem das constituições na antiguidade: o Conselho de Deliberação sobre matérias comuns, o Principado ou a Magistratura, e a Justiça. Observa-se que o Estado escravista é gerido de forma direta pelos cidadãos gregos sob liderança dos senhores fundiários (com participação rara de escravos) e por meio desse sistema conseguiam assentar juridicamente as questões de qualquer matéria do Estado. Uma das várias consequências desse modelo originário foi a legitimação de uma monarquia como melhor solução de representação social nos moldes aristocráticos (MÜNCHEN, 2000).

  • Na análise de München (2000) sobre essa aproximação do pensamento aristotélico no que tange à divisão jurídico-institucional nota-se o paradigma do nascimento das três grandezas orgânicas remodeladas pelo Barão de Montesquieu no século XVIII. A intenção da proposta era convencer as massas a aderirem por si mesmas à idealização de um poder supremo e imutável de Estado, compostas por três partes que tratariam de equilibrar-se com o simples exercício de suas funções.

  • Por sua vez, na Idade Média, há uma fragmentação das atribuições públicas nos Estados Feudais Estamentais no que consistia numa organização social dividida em grupos sociais separados um dos outros por privilégios, tal como uma estrutura hierárquica, de maneira que os órgãos seguiam subordinações a diversas formas de tarefas de administração. Essa forma administrativa calcada sem nenhum critério coaduna com a formação de divisões de órgãos conforme a própria conveniência. Logo, neste contexto, surge a instituição judiciária de natureza de poder ideológico eclesiástico (MÜNCHEN, 2000).

  • München (2000) explana que a Igreja Romana começa a introduzir grande influência nas políticas de Estado e imperadores. Nessa época, a Igreja adquire doações e acumula terras para aumentar mais seu poder de barganha para negociar com o Estado. Essa soberania da Igreja-Romano Cristã prevaleceu até o século XVIII, razão pelo qual iniciou o desencadeamento de uma série de embates com outras dinastias, o que legitimou a introdução do Tribunal para Erradicação de Heresias.

  • A perseguição é institucionalizada e bispos e arcebispos tomam funções de inquisidores judiciários, de modo que só no final do século XVIII, o Tribunal da Santa Inquisição se sofisticou como aparelho burocrático especial. Em síntese, o judiciário com moldes eclesiásticos foi determinante para a forma de um Direito Inquisitorial cruel, no qual se permitia grande liberdade da parte do acusador para que conduzisse de forma que achasse conveniente o julgamento (MÜNCHEN 2000).

  • Só no encadeamento da formação dos Estados Monárquico-absolutistas se manifestam as divisões estatais, correlacionadas aos poderes privativos dos monarcas. Essa é uma percepção que compreende a minoração do poder eclesiástico, via consolidação da associação entre a imagem do príncipe soberano e a de Deus.

  • Sob a influência das experiências trágicas da Guerra dos Trinta Anos, Thomas Hobbes apresenta o Estado em moldes absolutistas como único detentor legítimo do poder de proteger homens contra uma infinidade de arbítrios individuais dos demais. Para Hobbes, apenas o soberano poderia ser legislador e juiz, uma vez que inexistiria razão para acreditar que um magistrado seguiria a mesma decisão do outro nem para arriscar-se a que a decisão fosse motivada por “razões pessoais”, o que seria uma contradição mortal para a legitimidade do Estado.

  • Ou seja, esse arranjo centrado na figura do monarca minimizaria as contradições dos processos estatais:


[...] o que faz a lei não é aquela jurisprudência, ou sabedoria dos juízes subordinados, mas a razão deste nosso homem artificial, o Estado, e suas ordens. E sendo o Estado, em seu representante, uma só pessoa, não é fácil surgir qualquer contradição nas leis, e quando tal acontece a mesma razão é capaz, por interpretação ou alteração, de eliminar a contradição. Em todos os tribunais de justiça quem julga é o soberano (que é a pessoa do Estado) (HOBBES, 1983).

  • De outro modo, na Revolução Gloriosa, desenrolou-se o fortalecimento dos domínios jurídicos da atividade estatal. No ano de 1653, na Inglaterra, desponta o primeiro modelo de divisão jurídica-institucional de poderes nos moldes das Revoluções Burguesas. Os conhecimentos científicos foram direcionados ao modo de produção capitalista e, por funcionarem, tornaram-se o padrão para a nova burguesia industrial (MÜNCHEN, 2000, não p.).

  • Nessa conjuntura, a ideia de contrato social se consolida entre os cidadãos burgueses, proprietários livres e juridicamente iguais como fundamento de validade de uma vontade supostamente geral (MÜNCHEN 2000).

  • Rousseau (2011) sugere em sua análise, publicada pela primeira vez no século XVII, a necessidade da existência de um ser superior para compreender as contradições das partes litigantes, isto é, para funcionar como grande entendedor das relações. No discernimento de Foucault (2013), o pensamento rousseauniano refaz a ideia sobre o que é transgressão à norma, tirando o foco da figura do monarca. Na versão contratualista de Rousseau, esse episódio deixa de significar uma ofensa ao monarca para se converter numa ofensa a toda sociedade, visto que se trata de ruptura do contrato social.

  • Nessa perspectiva, a punição é despersonalizada e o crime passa a ser visto como um erro, e não como uma agressão. Na medida em que a definição de erro passa pelo crivo da sociedade, o sentimento de culpa por tê-lo cometido teria origem na relação do indivíduo com ela, e essa sociedade teria legitimidade para punir o transgressor (FOUCAULT, 2013).


2.2 COMO SURGIU E A QUEM SERVIA O PODER JUDICIÁRIO

  • Montesquieu (2000) defende a existência do Poder Judiciário com o argumento de que as pugnas que punham em lados opostos burguesia, realeza e nobreza exigiriam um elemento mantenedor do poder político e, consequentemente, do poder supremo do Estado. É dessa perspectiva que emerge a doutrina aristocrática-burguesa denominada tripartição jurídico-institucional de Estado, empreendida em 1748 no livro Sobre o Espirito das Leis. Nessa obra foi lançada a semente de uma ideia que até hoje influencia as repúblicas, a de separação entre poderes (“tudo estaria perdido se o mesmo homem [...] exercesse os três poderes”), sendo que, para Montesquieu, o judiciário não deveria ser profissão nem atribuição de segmento social: o homem precisa ser julgado por “seus pares” em tribunais não permanentes de composição descrita em lei (MONTESQUIEU, 2000, p. 169). Para Machado (2010, p. 90), a soma de limitações pressupõe que Montesquieu não propôs que o judiciário fosse uma esfera autônoma nem de poder comparável aos das demais.

  • É importante, no entanto, modular o que Montesquieu quis dizer ao se referir a “pares”. Na sua obra, o teórico delimita esse conceito, visto que deixa claro que há empecilhos a que o povo julgue a nobreza. Em um ponto, por exemplo, estabelece que observar classes sociais é relevante para evitar julgamentos injustos, de modo que “os grandes” são sempre perseguidos pela inveja, e se fossem julgados pelo povo, seus privilégios estariam ameaçados. Ademais, Montesquieu (2000, p, 175) ressalta que “[...] é preciso que os nobres sejam levados não aos tribunais ordinários da nação, e sim por esta parte do corpo legislativo que é composta de nobres”. Com efeito, Montesquieu compreende que a função de julgar surgiu das pugnas dos nobres e burgueses, não priorizando a ideia numa única grandeza.

  • Nesse contexto, o Poder Judiciário aflora de forma bem frágil, desprovido de projeto de manutenção permanente como parte do instituto-jurídico idealizado por Montesquieu (MÜNCHEN, 2000).

  • Em uma perspectiva crítica sobre a tese de separação de poderes, Marx e Engels – 1845:1846 (2007) expuseram em A Ideologia Alemã que a concepção surgiu da necessidade de dividir poderes entre duas classes dominantes, no caso, aristocracia e burguesia. Os autores evidenciam que o pensamento de uma classe dominante fundamenta-se na exteriorização nas relações materiais dominantes na consciência dos indivíduos que pertencem a essas mesmas classes predominantes. Logo, a divisão de poderes respondeu a um anseio elitista que fez surgir toda uma doutrina que também foi feita dominante. Para Marx e Engels, a teoria política espelha a modulação dos interesses na disputa hegemônica das classes, no qual o povo não está incluído, do mesmo modo que supostamente não tem capacidade de governar, atuando apenas como coadjuvante dos mais “esclarecidos”.

  • O próprio Montesquieu (2000, p. 171), com seu discernimento de indivíduo oriundo das classes dominantes, corrobora que sua teoria parte do ponto de vista de que os principais poderes estatais devem ser entregues a representantes, não ao próprio povo: “A grande vantagem dos representantes é que eles são capazes de discutir os assuntos. O povo não é nem um pouco capaz disto. O que constitui um dos grandes inconvenientes da democracia”. Ao povo, cabe o papel de escolher quem o represente (para tomar as decisões as quais é incapaz de tomar), tendo em vista que qualquer homem é, de certa forma, dotado de qualidades suficientes para decidir entre os seletos candidatos quem tem maior grau de esclarecimento.

  • No contexto da Revolução Francesa, o Poder Judiciário só começou a ter relevância a partir do momento em que o Estado passou a ser governado pela burguesia francesa, que perseguiu o intuito de moldar a revolução ao instituto da separação de poderes, mas de forma que estivessem alinhadas as esferas jurídica, monárquica e aristocrática. Os ideais da burguesia prevaleceram, destruindo radicalmente os restos das sociedades feudais (MÜNCHEN, 2000).

  • No decorrer desse processo de acomodação, os teóricos do século XVIII, entre eles, Rousseau atuou como pilares da construção da doutrina da democracia, inclusive da doutrina da soberania popular, no intuito de consolidar o princípio de que o Estado poderia unificar os poderes jurídicos institucionais de forma a serem “derivados do povo”, ainda que esses poderes fossem exercidos por uma maioria de integrantes da burguesia (ROUSSEAU, 2011).


2.3 A CONSOLIDAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO

  • O advento das revoluções burguesas e proletárias, que incluiu sucessões de golpes de Estado e extrema instabilidade política, foi uma atmosfera que durou praticamente todo o século XIX e permite visualizar a construção dos Estados Burgueses (MÜNCHEN, 2000).

  • A característica desses estados se consolidou em torno do fortalecimento da burocracia e da força militar, como Karl Marx pontuou em Dezoito de Brumário de Luís Bonaparte, que permite melhor compreensão daqueles conturbados momentos históricos. Segundo o teórico, a centralização de poderes no Estado moderno garantiu que certa estrutura monárquica permanecesse em alguma medida:


Esse poder executivo com a sua monstruosa organização burocrática e militar, com a sua máquina estatal multifacetada e artificiosa, esse exército de funcionários de meio milhão somado a um exército regular demais meio milhão, essa terrível corporação de parasitas, que envolve o organismo da sociedade francesa como uma membrana e entope todos os seus poros, surgiu no tempo da monarquia absoluta, na época da decadência do sistema feudal, para cuja aceleração contribuiu. Os privilégios senhoriais dos proprietários de terra e das cidades se transformam na mesma quantidade de atributos do poder estatal, os dignitários feudais passam a condição de funcionários remunerados e o catálogo multicor dos potentados medievais conflitantes de converte em plano regulamentado de um poder estatal cujo trabalho é dividido e centralizado como numa fábrica. A primeira revolução francesa, ao cumprir a tarefa de quebrar todos os poderes autônomos nos níveis local, territorial, citadino e provincial, visando criar a unidade nacional burguesa, necessariamente desenvolveu o que a monarquia absoluta havia começado: a centralização e, junto com ela, o raio de ação, os atributos e os servidores do poder governamental (MARX, 2011b, p.140-141).
  • Ao abordar esse cenário, München (2000) tratou da forma como, do dualismo entre a burguesia e os monarquistas, emerge o desenvolvimento da idealização de independência dos juízes e de seus apêndices – garantias como vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de salários – na medida em que os juízes se desvinculam dos poderes do Executivo de origem monárquica.

  • Uma vez que a burguesia europeia se consolidou como classe dominante, o Poder Judiciário, desvinculado da subordinação ao Legislativo e Executivo, se converteu num grande aliado da classe dominante na luta entre burgueses e proletários, que se organizaram em partidos revolucionários frente às instabilidades eleitorais. No entanto, o processo de consolidação do Poder Judiciário se concretizou numa esfera acentuada de acontecimentos políticos (MÜNCHEN, 2000).

  • Com o desenvolvimento gradual do Poder Judiciário em torno de uma conjunção burocrática com a burguesia, o instituto jurídico efetiva-se como poder jurídico-institucional de Estado. Isso significa que se posicionam como membros conservadores em contextos nos quais partidos políticos se acirram (MÜNCHEN, 2000).

  • Entretanto, cabe ressaltar o caráter determinante da natureza judiciária como guardiã da constituição dos Estados burgueses imperialistas.

  • Após a Primeira Guerra Mundial, o Poder Judiciário concentrava toda uma característica pompa de privilégios – carreirismo, vitaliciedade, inamovibilidade, inclusive com irredutibilidade de salários –, o que fez sua autoridade sobressair nas sociedades capitalistas contemporâneas, ao mesmo tempo em que o distanciou das classes trabalhadoras. A classificação como “poder técnico”, assim como os cargos geralmente não eletivos (e, quando eletivos, com regras específicas em relação às eleições gerais), têm como propósito confundir a classe trabalhadora quanto à notória natureza política do judiciário, cuja interpretação e aplicabilidade ideológica advêm da moldagem dos pensamentos das classes dominantes esclarecidas desde os primórdios de sua delineação (MÜNCHEN, 2000).

  • Finda a Segunda Guerra Mundial, assenta-se a doutrina de Hans Kelsen, que consolida o Poder Judiciário como autêntico guardião da Constituição dos Estados burgueses por meio do uso da chamada hermenêutica jurídica de maneira instrumental na manutenção da ordem constitucional (KELSEN, 2012).

  • Assim como houve o forjamento gradativo do Poder Judiciário a partir de sua origem nas classes dominantes, com o fundamento do trabalho do judiciário (as leis e as normas) sucedeu-se o mesmo, visando à manutenção da mesma linha preponderante de interesses das elites mediante os órgãos da comunidade jurídica.

  • Essa relação intrínseca entre a forma como a jurisdição e as leis são realizadas está descrita nas palavras do jurista alemão:

Na distinção entre proposição jurídica e norma jurídica ganha expressão a distinção que existe entre a função do conhecimento jurídico e a função, completamente distinta daquela, da autoridade jurídica, que é representada pelos órgãos da comunidade jurídica. A ciência jurídica tem por missão conhecer – de fora, por assim dizer – o Direito e descrevê-lo com base no seu conhecimento. Os órgãos jurídicos têm – como autoridade jurídica – antes de tudo produzir o Direito para que então ele possa ser conhecido e descrito pela ciência jurídica. (KELSEN, 2012, p.81)
  • Assim, ressalta-se que a teoria de Kelsen (2012) deixa notório como o forjamento das leis/normas está alinhado à técnica dos juristas, por meio da qual chega aos órgãos do Poder Judiciário, às autoridades jurídicas e ao Direito, de acordo com a ciência jurídica imposta pela tutela do Estado. Tais formulações influirão diretamente na estrutura nas contradições da democracia com o Estado de Direito.

3 O ESTADO DE DIREITO EM CONTRADIÇÃO COM A DEMOCRACIA

  • Uma definição que faz refletir sobre os temas referentes ao Estado de Direito vem de Canotilho (1999, p. 11), para quem o “Estado de direito é um Estado ou uma forma de organização político-estatal cuja atividade é determinada e limitada pelo direito”. O Estado delimitado a que alude o autor é o definido por uma Constituição na qual estão contidos os seguintes preceitos: o império da lei, a separação dos poderes e a prevalência dos direitos individuais fundamentais.

  • O conceito angaria novo sentido depois que se compreende o surgimento da tripartição de poderes e a evolução do Poder Judiciário, ambos nascidos de concepções advindas das classes dominantes. Essa foi a dinâmica constante desde a Antiguidade, no Estado de cidadãos proprietários de escravos; na Idade Média, quando os reinos eram mantidos pela nobreza feudal; e no moderno e atual Estado burguês. Dessa forma, ao se perceber o Estado como desenvolvido e moldado paulatinamente sobre uma estrutura de classes, é possível visualizar o verniz de legitimidade no conceito de Estado de Direito, posto que exista disparidade entre Estado de Direito, democracia e redistribuição econômica (MARAVALL; PRZEWORSKI, 2001).

  • Segundo Maravall e Przeworski (2001), devido à judicialização da política, o Estado de Direito converteu-se num instrumento com intuito de proteger os indivíduos da “tirania” de uma maioria. Assim, governos eleitos por uma maioria conseguiriam violar direitos individuais, repartir recursos, desapossar propriedades, além de intervir na economia. No Estado de Direito, o Poder Judiciário possui respaldo institucional estatal, revelado em suas garantias judiciais.

  • Uma dessas garantias é a independência judicial, que oferece ao Judiciário o monopólio da forma de judicializar a “justiça”. Exemplos de tais prerrogativas: a não anulação de decisões judiciais por meios retroativos, mesmo por legislação ou por clamor do legislativo ou executivo; a garantia da inamovibilidade dos juízes em caso de decisões de fora; a estabilidade do procedimento judicial, imunidade de revisão tanto do executivo quanto do legislativo; a submissão do legislativo e executivo nos seus atos legislativos e executivos; o respeito às decisões anteriores como guia de orientação às decisões supervenientes, além da revisão somente de um tribunal (MARAVALL; PRZEWORSKI, 2001).

  • Outrossim, o Poder Judiciário é isento de responsabilidade democrática no que tange a juízes, enquanto o Estado de Direito delimita os abusos por políticos. Ocorre que juízes podem ter interesses políticos próprios, tendo em vista que são invulneráveis à imposição política de outras divisões de poderes de Estado. Nasce aqui a tendência intrínseca de praticar o poder político, exercício que sobrepesa nas ocasiões de auxílio ao legislativo na criação de leis (MARAVALL; PRZERWORSKI, 2001).

  • Nota-se que há contradições entre os poderes (ou entre as elites que os controlam), mas apenas no sopesamento de quem vai reger o poder político do Estado. A questão é: quais são os conflitos nessa dinâmica quando o Poder Judiciário está incluído?


3.1 A DUALIDADE DO ATIVISMO JUDICIAL

  • Ocorre ativismo judicial político quando políticos recorrem à justiça com o objetivo de adulterar a forma concorrencial de democracia, enquanto estão instituídos o Estado de Direito e a democracia (MARAVALL; PRZERWORSKI, 2001).

  • Quanto às formas de ativismo judicial, existem três hipóteses verificáveis: a primeira diz respeito à judicialização política em conluio com uma estratégia da oposição, em uma situação em que a oposição tem histórico de eleições fracassadas; na segunda, sendo as eleições o único meio de chegar ao poder, os políticos substituem as vitórias por exonerativos (promovem nulidades); já na terceira, os poderes buscam interferir uns sobre os outros como forma de impor relevância, com uso da via judicial. Também o governo pode manobrar o ativismo judicial com a intenção de assentar seu poder, e de tal sorte, minorar as forças da oposição (MARAVALL; PRZERWORSKI, 2001).

  • Dessas situações, se constrói o paradoxo verificável entre democracia liberal e judiciário independente, visto que o judiciário tem ferramentas à disposição para interferir nos processos democráticos. Esse poder tanto pode agir para o que avalia ser uma reparação da democracia (“corrigir suas aberrações”, como escreveu Tocqueville em Da Democracia da América) quanto pode ser coibido ao confrontar interesses de governantes, como quando permite que cidadãos acessem informações que os permitam fiscalizar o Estado. Visualizam-se, assim, simultaneamente, o antagonismo entre democracia e judiciário, assim como o fato de que ambos vivem em harmonia e se apoiam quando é conveniente (MARAVALL; PRZERWORSKI, 2001).

  • Portanto, Maravall e Przerworski (2001) expõem que a judicialização no âmbito político dependerá de dois fatores: a responsabilidade política do governo e a probabilidade de vitória da oposição.

  • Outra forma de ativismo judicial surge como instrumento neoliberal, portanto é salutar compreender o recorte histórico do advento do neoliberalismo.

  • Brown (2018) trata da forma como o Estado de Bem Estar Social foi alvejado pelo neoliberalismo durante a ascensão dessa ideologia política a partir da década de 1970:

(...) a partir do momento em que a neoliberalização foi violenta e repentinamente imposta em partes do sul global, nas décadas de 1970 e 1980, seja por conquista imperial, golpes de Estado internos, exigência do Fundo Monetário Internacional (FMI) ou alguma combinação destes, o trabalho foi amordaçado e o capital, posto à solta. Exemplos famosos incluem o Chile sob Pinochet e os Chicago Boys, após a derrubada de Allende, o Iraque sob Paul Bremer depois da queda de Saddam Hussein, e a restruturação, pelo FMI, de algumas nações enfraquecidas e endividadas do hemisfério sul. De um lado, as indústrias estatais são privatizadas, proprietários estrangeiros são atraídos, a retenção de lucros é assegurada; de outro, greves são criminalizadas, e os sindicatos, limitados, por vezes até declarados ilegais (BROWN, 2018, p. 24).

  • O projeto neoliberal nasce por meio de políticas que desestruturam países subdesenvolvidos sob um verniz normativo de legitimidade de ação, obstruindo toda forma de organização civil popular no que tange à proteção de direitos (BROWN, 2018). Por esse ângulo, é possível abordar o ativismo judicial como instrumento neoliberal com fundamento em quatro emblemáticas decisões legais ocorridas nos Estados Unidos, todas relacionadas a situações em que cortes supremas (maior instância do judiciário em nível federal e nos estados) defenderam interesses de setores econômicos.

  • No caso Citizens United versus Federal Election Commission, uma decisão da Suprema Corte derrubou veto do governo no que tange a financiamentos de empresas a Super-PARs[1]. Ocorre que, no caso, a corte nivelou as empresas à categoria de pessoa, o que trouxe como consequência a permissão para que o dinheiro privado viciasse o processo eleitoral. No caso At&T Mobility LLC versus Conception, a corte coadunou com empresas ao anular processos pertinentes a processos de ações coletivas, obrigando consumidores descontentes a tentarem impugnação por meio de ações individuais. A decisão teve reflexos sobre direitos trabalhistas, uma vez que as ações coletivas eram um instrumento fundamental para persistência da classe trabalhadora contra condutas empresariais fraudulentas e discriminatórias. Entretanto, a Suprema Corte do Estado de Wisconsin sustentou uma lei estadual com a finalidade de exaurir o poder de barganha coletivo relacionado aos sindicatos de trabalhadores públicos, ao permitir a negociação de salários, sem que sejam abordados benefícios e condições de trabalho. Por fim, no caso Walt-Mart Stores, INC versus Dukes, novamente a Suprema Corte rechaçou uma ação coletiva contra o Walt-Mart por meio da qual 1,5 milhão de funcionárias buscavam indenização por discriminação de gênero nos salários. Isso porque a corte decidiu não aceitar a reivindicação das mulheres como classe, justificando ausência de razões suficientes para isso (BROWN, 2018).

  • Segundo Brown (2018), o fato dos juízes terem julgado as ações pelo viés de interesses econômicos em vez de pela proteção de direitos ou dos princípios democráticos é um indício de como o ativismo judicial funciona na defesa de ideologias ou interesses políticos.

  • O autor complementa:


(...). As decisões legais citadas [...] atacam todos os níveis do poder do cidadão organizado e da conscientização política nos EUA, ao passo que julgam direitos sob a ótica de princípios econômicos. A primeira permite que empresas comprem o último ícone de soberania popular na democracia neoliberal: as eleições. A segunda elimina o principal meio legal que permite que consumidores ou trabalhadores se unam para lutar contra abusos empresariais. A terceira e quarta se juntam a um cordão de leis recentes que constrangem a capacidade de trabalhadores dos setores público e privado de atuar em conjunto (BROWN, 2018, p. 27-28).

  • Por conseguinte, tornam-se explícitas as formas como o Judiciário pode pesar a balança em desfavor da democracia quando atua em prol de setores que buscam a manutenção de vantagens, pela manutenção de mecanismos de exploração capitalista e pela proteção de seu conjunto de influência e autoridade perante as outras divisões de poderes.

  • Ainda no tocante à realidade dos Estados Unidos, questões referentes à Suprema Corte e à sua interferência na democracia chamaram a atenção do cientista político Robert Dahl durante sua análise sobre os resultados da eleição presidencial estadunidense de 2000. Críticas referentes ao Judiciário daquele país estão reunidas no último livro publicado por ele, A constituição norte-americana é democrática? (2014), e é objeto do próximo tópico.

3.2 A CRÍTICA DE ROBERT DAHL À ORDEM CONSTITUCIONAL DOS ESTADOS UNIDOS

  • Ao analisar o sistema eleitoral estadunidense, Dahl (2014) detectou elementos antidemocráticos, os quais denominou “tendências oligárquicas”, embutidas na Constituição dos Estados Unidos. O autor ressaltou a existência de discrepâncias entre fama (de expoente liberal) e texto da Carta Magna em relação à igualdade política, além de instrumentos institucionais que expuseram a eleição presidencial de 2000 a um viés desigual. Na conclusão de Dahl, o documento possui em suas entrelinhas o objetivo de salvaguardar privilégios de uma minoria de proprietários em contraposição à maioria de cidadãos comuns – e, em meio a isso, deixando brechas para que o Judiciário atuasse por esse caminho.

  • Entre os sete princípios da Constituição[2] que o cientista político enumera como exauridores da igualdade política, dois dizem respeito à Suprema Corte. Um deles foi o respaldo dessa corte à conservação das barreiras constitucionais originais ao direito de voto, em contrassenso à reivindicação pela ampliação do sufrágio às minorias, o que só foi anulado em 1964. O teórico também menciona episódios em que o Supremo Federal mostrou-se alinhado a uma elite política para declarar a inconstitucionalidade de leis aprovadas democraticamente (DAHL, 2014).

  • Para Dahl (2014, p. 55), é inegável que a interpretação sobre uma lei não vem destituída de ideologias pessoais. Frente a isso, seria a seu ver bastante questionável o fato de ministros não eleitos possuírem o poder de barrar o sistema legislativo em franco funcionamento (na conta de uma maioria simples, no caso dos Estados Unidos, de cinco entre nove):


American legal scholars have struggled for generations to provide a satisfactory rationale for the extensive power of judicial review that has been wielded by our Supreme Court. But the contradiction remains between imbuing an unelected body—or in the American case, five out of nine justices on the Supreme Court—with the power to make policy decisions that affect the lives and welfare of millions of Americans. How, if at all, can judicial review be justified in a democratic order? (DAHL, 2014, p. 55).

  • Como visto a principal crítica de Dahl aos princípios constitucionais do judiciário estadunidense é quanto ao que ele percebe como possibilidade de a Suprema Corte legislar em vez de apenas proceder ao controle de constitucionalidade sobre atos legislativos e administrativos. Mas há também desconforto quanto à forma como os ministros dessa corte são escolhidos, o que perpassa o reconhecimento de que o cargo está diretamente ligado aos interesses das elites politicas da vez (DAHL, 2014, p. 153-154).

  • Em seu otimismo, o autor defende, contudo, que a corte poderia ter papel pela promoção da democracia se focasse esforços na defesa de direitos fundamentais e de questões relacionadas ao federalismo (especialmente relevantes no caso dos Estados Unidos) (DAHL, 2014, p. 154-155).


4 O ESTADO NA CONCEPÇÃO MARXISTA

  • Para München (2000), no pensamento marxiano o Estado consiste na predominância do poder de uma classe sobre outra economicamente mais fraca mediante o uso de instrumentos de opressão. Portanto, já de antemão essa perspectiva aponta o Judiciário como ferramenta no interior de uma superestrutura voltada ao domínio de classe, isto é, pronta a se mover na direção do papel em torno da qual foi construída.

  • O surgimento do Estado segundo o marxismo é deslinhado por uma análise cronológica de Engels (2006) em A origem da família, da propriedade privada e do Estado. Nessa análise está expresso o fundamento histórico gradativo de uma instituição moldada para a exploração de uma minoria sobre uma maioria propiciando legitimidade à acumulação de riquezas.

(...) o direito paterno, com herança dos haveres pelos filhos, facilitando a acumulação das riquezas na família e tornando esta um poder contrário à gens, a diferenciação de riquezas, repercutindo sobre a constituição social pela formação dos primeiros fundamentos de uma nobreza hereditária e de uma monarquia; a escravidão, a princípio restrita aos prisioneiros de guerra, desenvolvendo-se depois no sentido da escravidão de membros da própria tribo e até da própria gens; a degeneração da velha guerra entre as tribos na busca sistemática, por terra e por mar, de gado, escravos e bens que podiam ser capturados, captura que passou ser uma fonte regular de enriquecimento. Resumindo: a riqueza passa a ser valorizada e respeitada como bem supremo e as antigas instituições da gens são pervertidas pra justificar-se a aquisição de riquezas pelo roubo e pela violência, falta apenas uma coisa: uma instituição que não só assegurasse as novas riquezas individuais contra tradições comunistas da constituição gentílica, que não só consagrasse a propriedade privada, antes tão pouco estimada, e fizesse dessa consagração santificadora o objetivo mais elevado da comunidade humana, mas também imprimisse o selo geral do reconhecimento da sociedade às novas formas de aquisição de propriedade, que se desenvolviam umas sobre as outras – a acumulação, portanto, cada vez mais acelerada, das riquezas –; uma instituição que, em uma palavra, não só perpetuasse a nascente divisão da sociedade de classes, mas também o direito da classe possuidora explorar a não possuidora e o domínio da primeira sobre a segunda.
Essa instituição nasceu. Inventou-se o Estado (ENGELS, 2006, p. 109-110).
  • Em suma: o direito paterno foi primeiro fundamento de transferência de riqueza, o qual contribuiu para o surgimento de uma nobreza hereditária; a escravidão de prisioneiros de guerra foi convertida em forma de enriquecimento; este que foi legitimado, uma vez que o pressuposto dessa sociedade passou ser a riqueza, justificando a violência e o roubo. Para isso, emerge o pensamento de uma entidade garantidora, que assegurasse todas essas desapropriações involuntárias, mas que tivesse uma aceitabilidade social, e que garantisse toda uma estrutura de superexploração, Engels denomina essa entidade como Estado (ENGELS, 2006).

  • Dessa forma o autor delineia o avanço de uma sociedade baseada numa classe economicamente dominante, na medida em que se utiliza de instrumentos que viabilizam uma política dominante, sob o jugo da exploração. Além dos órgãos burocratas, o Estado apresenta entre suas características significativas as forças opressivas, entre elas as armadas, em permanente disposição para o exercício de institutos penais como prisões e coerções. Ademais, a estrutura estatal passa paulatinamente a ser algo indispensável às divisões de classes, motivo pelo qual se tornaram mais contundentes os conflitos entre os grupos acerca dos interesses materiais (ENGELS, 2006).

  • Nessa conjuntura, o Estado se consolida como representante oficial da sociedade com características mais orgânicas, acima da própria sociedade. Essas características advêm do recolhimento de impostos, bem como do assentamento da dívida pública, em alinhamento com as garantias jurídicas de inviolabilidade (ENGELS, 2006).

  • Em contraposição, Engels (2006) explica que, nas sociedades primitivas, as pessoas não careciam de Estado, logo, com o florescimento do desenvolvimento da produção social, as divisões de classes se exauririam no decorrer do processo. Outrossim, em um panorama de extinção das lutas de classes e da aparição da associação livre e igual de produtores, o Estado deixaria de existir, tornando-se apenas um objeto de museu “ao lado da roda de fiar e o machado de bronze” (ENGELS, 2006).

  • Na mesma toada escreve Marx em a Miséria da Filosofia:

No curso de seu desenvolvimento, a classe laboriosa substituirá a antiga sociedade civil {sociedade burguesa} por uma associação que excluirá as classes e seu antagonismo, e não haverá mais poder político propriamente dito, já que o poder político é justamente o resumo oficial do antagonismo na sociedade civil {sociedade burguesa} [grifos originais]. (MARX, 2017, p.147).

  • Na Crítica do Programa de Gotha Marx (2012, p. 19-22), o entendimento sobre o inevitável definhamento de Estado estaria no cerne de uma fase de “transformação revolucionária de uma na outra. A ele corresponde também um período político de transição, cujo Estado, não pode ser senão a ditadura revolucionária do proletariado”.

  • Assim o teórico consolida seu raciocínio na possibilidade de substituição da velha forma de Estado por um novo modelo, com base organizativa proletária, com moldes de centralidade democrática e de natureza administrativa, conforme escritos do autor em O Estado e a Revolução (LÊNIN, 2017).

  • Prosseguindo nas questões das nuances do Estado Burguês, a lei, no que tange o Direito Proletário, passa a regular a propriedade dos meios sociais de produção legitimando por si a desigualdade material entre os homens, no denominado Direito Burguês, segundo a compreensão do autor em A Legalização da Classe Operária (EDELMAN, 2016).

Devemos nos livrar de uma vez por todas da ilusão tenaz de um “direito operário” que manteria distância do direito burguês, que seria um tubo de ensaio em que se elaboraria um “novo direito”. Tradicionalmente, os especialistas têm empregado seus esforços nesse sentido. É necessário, dizem esses especialistas, autonomizar o direito do trabalho, dar-lhe seus títulos, reconhecer sua especificidade. Ele é, continuam eles, um direito coletivo, um direito de massa, para as massas, que já não tem nada – ou tem cada vez menos – a ver com direito “comum”, leia-se, o direito civil. Desse esforço nasceu o “socialismo dos juristas”, que se perpetua até hoje sob as espécies sutis e técnicas das relações entre direitos: direito do trabalho/direito civil, direito do trabalho/comercial, direito do trabalho/direito público...
Como se o trabalho estivesse “do lado” do capital e do Estado! Como se o “direito operário” não fosse o direito burguês para o operário! E como se, enfim, milagrosamente, o direito do trabalho fosse uma zona juridicamente “protegida”!
Não existe o “direito do trabalho”; existe um direito burguês que ajusta ao trabalho, ponto final (EDELMAN, 2016, p. 19).

  • Nota-se assim a instrumentalidade da lei em prol das classes dominantes. É dessa maneira também que se legitima a exploração pelos moldes jurídicos burgueses. A constatação leva à compreensão de que o Direito Burguês tem raízes na desigualdade material dos homens e que essa regulação decorre de um domínio sobre a partilha dos bens de consumo, de modo indispensável à vida, conforme determina o princípio jurídico-burguês: a quantidade de trabalho deve ser a mesma da quantidade de produtos produzidos pelo trabalhador (MÜNCHEN, 2000).

  • Tenha-se em mente que, no estágio do socialismo, ainda é insustentável a realização da justiça material e da igualdade real, uma vez que continuam persistindo as desigualdades de riquezas, mesmo não sendo mais possível a exploração do homem pelo homem. Com o advento do comunismo – a essencial eliminação da subordinação do homem as formas de divisão de trabalho, assim como das diferenças de hierarquia entre trabalho físico e intelectual – exaure-se o pensamento de trabalho como meio de subsistência para o retorno às primeiras formas de necessidade da vida. Nesse sentido, o Direito Burguês pode ser superado, segundo o princípio comunista de convivência social: dar a cada um segundo sua capacidade, de acordo com sua necessidade (MARX, 2012).

  • No tópico a seguir, aborda-se a apresentação de Marx sobre a experiência da Comuna de Paris, quando houve os primeiros substratos de uma sociedade socialista na intenção de substituir o velho modelo de Estado burguês.


4.1 A EXPERIÊNCIA DA COMUNA DE PARIS

  • Durante a Comuna de Paris, em 1871, de acordo com os escrito de A Guerra Civil na França teve lugar a primeira experiência histórica de grande importância à classe trabalhadora e dos oprimidos, na perspectiva de um processo revolucionário proletário. O movimento foi base de uma multiplicidade de programas e formulações teóricas (MARX, 2011a).

  • Para marxistas, os 71 dias de duração da Comuna de Paris foram um relevante laboratório para estudos:

  • No movimento revolucionário das massas, ainda que este não tenha atingido seu objetivo, via uma experiência histórica de enorme importância, algo como um passo em direção à revolução proletária mundial, o passo prático mais importante que centenas de programas e raciocínios (LÊNIN, 2017, p.60).

  • A experiência permitiu a Marx investigar um processo revolucionário em curso, ou seja, a antítese direta do Estado Imperial Francês, com objetivo da formação de uma República com capacidade de eliminar a monarquia e o domínio pela burguesia (MARX, 2011b).

  • Durante a Guerra Civil da França, no âmbito da consolidação da Comuna de Paris, foram viabilizadas condições para que o Estado Burguês fosse destruído por intermédio da democracia republicana das massas proletárias com fundamento nas instituições públicas com diversos princípios organizativos (MARX, 2011a).

  • O Estado Burguês perdeu sua essência, sua natureza foi alterada pela atuação de um aglomerado de pessoas com um senso de organização de Comuna, reunidas na finalidade de refrear a resistência permanente de uma minoria burguesa exploradora (MARX, 2011a).

  • O Estado Operário começou ser desenvolvido de modo concomitante à transição do exército permanente pelo povo armado; operários e camponeses se apropriaram do poder, tal poder retirado das forças particulares que serviam às elites econômicas exploradoras; as forças policiais foram destituídas das prerrogativas político-burguesas e remodeladas na forma de Comuna, cujo mandato era revogável a qualquer tempo, o que foi válido até para os funcionários de outros ramos da administração pública, inclusive os membros do judiciário – que foram totalmente desprovidos de sua independência e se tornaram obrigados a prestar contas das suas atividades jurisdicionais à Comuna (MARX, 2011a).

  • Juízes, procuradores e demais membros do funcionalismo do judiciário passaram a ser eleitos e sujeitados à revogação de seus mandatos a qualquer tempo. Nessa nova ordem, o serviço público passa a ser entregue à elegibilidade e à revogabilidade a qualquer tempo, na intenção de extinguir qualquer privilégio (MARX, 2011a). Da mesma forma, o movimento culminou na extinção dos gastos públicos do Estado Burguês em relação ao exército permanente e ao funcionalismo estatal. A interpretação marxiana é de que a Comuna ratificou as falsas propagandas da classe burguesa relativas à redução de gastos, assim como viabilizou um governo bem mais acessível (MARX, 2011a).

  • Durante a Comuna emergiu um conceito de Estado administrador, voltado para o trabalho, com foco na liberdade municipal local e na unidade nacional, de forma oposta às inclinações federalistas. A postura não tinha a ver com a eliminação das formas de elegibilidade das instituições representativas, mas com a consolidação de órgãos de trabalho concreto. Em outras palavras: na construção de organismos não voltados a discussões políticas, mas sim de um órgão técnico proletário com funções executivas no que tange ao controle, ao registro, à supervisão, à contabilidade, entre outras atividades (LÊNIN, 2017).

  • Desse modo, a Comuna substitui aparentemente a máquina de Estado quebrada “apenas” por uma democracia mais completa: a extinção do exército permanente, plenas elegibilidade e revogabilidade de todos os funcionários públicos. Mas, na realidade, este “apenas” significa a substituição gigantesca de algumas instituições de tipo fundamentalmente diferente. Aqui se observa exatamente um dos casos de “transformação da quantidade em qualidade”: a democracia, realizada de modo tão completo e consequente quanto é concebível, converte-se de democracia burguesa em proletária, de Estado (= força especial para a repressão de determinada classe) em uma coisa que já não é, para falar propriamente, Estado (LÊNIN, 2017, p.66).

  • Considera-se o experimento da Comuna de Paris o primeiro ensaio concreto de operacionalização do funcionalismo público com a presença majoritária de trabalhadores. Foram dias de um governo, nas palavras de Marx (2011a, p.15) “(...) barato – ao destruir [suprimir] as duas maiores fontes de gastos: o exército permanente e o funcionalismo de Estado”.

4.2 OS TRIBUNAIS POPULARES ELETIVOS

  • Trotsky (1991) em A Revolução Traída transporta a experiência da Comuna de Paris para o experimento soviético, o Partido Comunista Bolchevique aplicou de forma efetiva os conceitos teóricos de Marx e Engels sob a revisão do esboço de destruição do Estado Burguês-Latifundiário, com base no novo poder proletário/camponês internacionalista e revolucionário sob apêndices dos trabalhadores armados na condução da transição ao socialismo.

  • Com efeito, a instituição dos Soviets dos Deputados dos Operários, Soldados e Camponeses sob a forma da ditadura do proletariado, milhões de trabalhadores foram convocados a cooperar espontaneamente nas atividades de execução/direção do Estado (LÊNIN, 2017).

  • Nesse sentido, o Poder Judiciário Russo é desmantelado pela Revolução de Outubro:

Na realidade, o Tribunal constituía, depois do exército permanente e da polícia burocrática, a mais sólida defesa do sistema burguês-fundiário.
Sob o ângulo de uma pretensa defesa do Direito e da justiça, o Poder Judiciário, dito independente do Estado Burguês, representava, entretanto, o mais sólido órgão do sistema capitalista e dos interesses das classes possuidoras.
Não apenas porque os tribunais eram agentes diretos do Estado e do poder estatal, instrumentos de assujeitamento das classes oprimidas, mas também porque eles, por sua situação social, pertenciam à classe dos opressores.
Eles entendiam o Direito e a justiça, bem como a liberdade e a igualdade, tal como os declaravam os interesses da sua classe (STUTCHKA, 1931, p.7, APUD MÜNCHEN 2000).

  • Stutchka (1931, APUD MÜNCHEN, 2000) compreende que o princípio da divisão técnica de poderes só tem valor de princípio de divisão técnica de trabalho se o Poder Soviético consistir num poder uno, cujos poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) estejam nele incluídos. Assim o poder popular se torna a República consolidada apenas pelos Soviets dos Deputados, operários, soldados e camponeses.

  • Em dezembro de 1917, Lênin decretou o primeiro ato normativo do Estado Soviético em relação à organização judiciária. O Decreto n° 1 sobre o Tribunal, redigido por Stutchka e Kotslovskii, introduziu nove artigos à legislação. O decreto extinguiu o primeiro artigo que tratava do órgão judiciário sob os regimes czaristas, burgueses, substituindo pelos tribunais populares eletivos segundo o Regulamento do Tribunal Popular da República Soviética da Federação Socialista Russa, de 30 de novembro de 1918, citado por München (2000):

Stutchka (1999, p. 229, APUD München 2000) “O Conselho dos Comissários do Povo decreta: (...) Suprimir as instituições judiciárias em geral, existentes até o presente momento : os tribunais regionais as câmaras judiciárias e o Senado de Governo com todos os seus departamentos, os tribunais de guerra e de marinha dotados de todos os nomes, e também os tribunais comerciais, substituindo todas essas instituições por tribunais formados na base de eleições democráticas”.

  • Como se verifica, a Revolução de Outubro extinguiu a priori o Senado de Governo (instituído por Pedro I em 1711), que era a corporação organizativa judiciária russa e que, no fim do século XIX, se convertera num órgão competente de delitos cometidos contra o Estado. Os membros do senado eram altos funcionários escolhidos pelo Czar. A Revolução de Fevereiro de 1917 havia mantido, de certa forma, a estrutura praticamente intacta do órgão supremo jurisdicional russo, o que permitiu que o Senado do Governo aprovasse o poder do novo Estado, levando à investidura do Czar Nicolau II. Assim, esse senado não tardou em proclamar “infame delito” a Revolução de Outubro de 1917 (MÜNCHEN, 2000).

  • Na sequência do decreto de Lênin, o Senado do Governo foi extinto, além dos órgãos judiciários inferiores, e consequentemente, todos os juízes do velho Poder Judiciário Russo foram retirados, mesmo existindo entre eles especialistas que contribuíram na causa da Revolução de Outubro. No lugar dos tribunais burgueses, foi inserido o Tribunal Popular Eletivo, composto por proletários e camponeses revolucionários, cuja competência era a de perquirir “as relações humanas, comuns e costumeiras” (MÜNCHEN, 2000).

  • Nesse processo de reestruturação dos órgãos populares, num contexto de muitas dificuldades, foram inseridos Tribunais Locais para suprir as necessidades das populações mais periféricas. Eram compostos de três juízes no mínimo, eleitos diretamente pelos Soviets, e a ideia era que a quantidade deles variasse de nove a 12 (conforme melhorassem as condições econômicas do país). Os juízes eleitos se comprometiam a prestar contas de suas atividades aos Soviets. Os mandatos eram revogáveis a qualquer tempo (MÜNCHEN, 2000).

  • Esses juízes podiam dar penas de privação de liberdade não superiores a dois anos. Para causas mais complexas (delitos mais graves), foi criado o Tribunal Regional Eletivo, composto por Jurados Populares, integrados por operários e camponeses. Como se nota, tais tribunais eram desprovidos de especialistas, tendo em vista que os juristas burgueses não se interessaram em se candidatar a essa nova forma de justiça revolucionária. Contudo, os dirigentes da Revolução de Outubro, prevendo essas circunstâncias desfavoráveis, partiram do princípio de que se as normas jurídicas fossem compreendidas somente por especialistas do Direito, não se alcançaria a verdadeira justiça, contrariando a “consciência revolucionária do

  • Direito” (MÜNCHEN, 2000).

  • Mesmo assim, retratando o esforço dos dirigentes em emplacar o novo modelo de justiça popular, nos casos mais complexos de litígios jurídicos, de circunstâncias que exigiam um conhecimento acima das capacidades dos juízes populares, havia a previsão de convocar especialistas técnicos (MÜNCHEN, 2000).

  • Em contraponto ao modelo jurídico burguês de uma hierarquia de instâncias e seus mecanismos de apelação, os Tribunais Locais, constituídos de instância superior na figura dos Conselho de Juízes Populares, operacionalizava seus casos como órgãos de cassação, anulando sentenças proferidas de Tribunais Locais, nos casos em que existisse flagrante injustiça. Assim, os Conselhos de Juízes Populares eram proibidos de pronunciar nova sentença de casos já julgados, mas podiam, em casos penais, minorar a pena ou declarar a absolvição. Portanto, conforme o artigo 2° do Decreto n° 1 sobre o Tribunal, as sentenças e as decisões prolatadas pelos Tribunais Locais, em regra, eram imutáveis, sem a possibilidade de apelação às outras instâncias superiores (MÜNCHEN, 2000).

  • A Procuradoria do Estado foi abolida, pois era vista pelos dirigentes como instituição de monopólio das atividades inquisitoriais da fazenda pública composta por jovens carreiristas. A Promotoria de Estado teve o mesmo destino, uma vez que conduzia as acusações criminais de interesse das classes exploradoras. Suas funções foram transferidas as todas as instituições públicas e a todo o povo, com liberdade de cumprir papéis de acusadores e defensores. Dessa forma, entregavase à sociedade a responsabilidade da justiça, que implicava participar dos tribunais populares locais (MÜNCHEN, 2000).

  • A profissão da advocacia foi suprimida, como também a advocacia juramentada e a particular, uma vez que seus rendimentos seriam uma forma de manter o estamento privilegiado dos juristas. Nesse estágio, os profissionais liberais do Direito, quase sem exceção, eram considerados inimigos de classe do governo dos camponeses, operários e soldados (MÜNCHEN, 2000).

  • Nesse período de mudanças, os Soviets de Deputados Operários, Soldados e Camponeses indicavam comissariados populares especiais à justiça; eram encarregados de preservar o patrimônio das instituições judiciárias e munidos da responsabilidade da guarda dos arquivos (produzidos sob sua direção). Assim, a Revolução de Outubro repeliu todo conceito jurídico-burguês de delito político, mas mantendo o combate intenso das formas de contrarrevoluções (MÜNCHEN, 2000).

  • Os dirigentes da Revolução de Outubro tentaram o máximo possível adaptar o ordenamento jurídico anterior conforme as necessidades de supressão de lacunas do novo Direito material revolucionário. Logo, eram aceitas somente normas jurídicas que não desrespeitassem a moral revolucionária, ou seja, a consciência revolucionária do Direito. Lênin acrescentou o artigo 5°, no qual esclareceu:

  • Stutchka (1999, p. 23, APUD München 2000) “Observação. Como abolidas são consolidadas todas as leis que contradigam os decretos do Comitê Executivo Central dos Soviets de Deputados Operários, Soldados e Camponeses e os decretos do Governo Operário e Camponês, bem como o programa mínimo do Partido Social-Democráta da Rússia e do Partido Social- Revolucionário.

  • Assim o governo justificava o aparato como a saída considerada plausível para operacionalizar as problemáticas sociais em um momento conturbado, de grandes abalos políticos sociais. Por sua vez, Lênin adiantava que a legislação teria um significado provisório, para dar respostas àquele momento de transição, todavia, no decorrer do tempo, ela se exauriria ou seria aprimorada (MÜNCHEN, 2000).

  • Seguindo as premissas marxianas, Lênin (2017, p.120) reiterou a transitoriedade do processo em curso, reverberando a complexidade do momento pós-revolucionário: “logo que o capitalismo for derrubado, as pessoas saberão, sem um tipo de Estado de direito, trabalhar para a sociedade; além do mais, a abolição do capitalismo não dá, de uma só vez, (...)”.

  • Os fundamentos do novo Direito Proletário Revolucionário foram nitidamente um contraponto ao Direito Burguês. Lênin dava importância central à economia, considerando-a como de natureza jurídica-pública, e não mais privada; aceitava apenas o capitalismo de Estado; ampliou o Direito do Estado na dissolução de contratos privados; substituiu o corpus iuris romani pela consciência revolucionária do Direito, de forma reiterada e persistente, nos processo de mudança dos modelos processuais (MÜNCHEN, 2000).

  • Toda a análise levou Stutchka a reparar que as formulações do artigo 5° do Decreto n° 1 sobre o Tribunal passaram a ser a pedra angular até dos adversários originais da Revolução de Outubro. Esses reconheceram que a revolução não absolveria ou condenaria seus inimigos com fulcro nas leis escritas, oficialmente aprovadas (MÜNCHEN, 2000).

  • Por fim, no decorrer dos anos de 1918 e 1919, com a consolidação do poder nas mãos dos operários e camponeses, Lênin temeroso com a natureza classista do judiciário, a respeito da formação dos tribunais eletivos populares da Revolução de Outubro, sugeriu as seguintes ponderações para elaboração do primeiro parágrafo em relação ao Projeto do Programa do PC da Rússia pertinentes aos tribunais:


Após ter abolido as leis dos governos derrubados, o Partido lança aos juízes eleitos pelos eleitores soviéticos a consigna de conferir validade à vontade do proletariado mediante a aplicação de seus decretos e, na hipótese de inexistência de tais decretos ou em caso de lacunas, de deixarem-se dirigir pela consciência socialista do Direito, sem levar em consideração as leis dos governos derrubados.
No caminho rumo ao comunismo, através da ditadura do proletariado, o Partido Comunista, desaprovando as consignas democráticas, elimina inteiramente também aqueles órgãos da dominação burguesa como os tribunais da velha estrutura, substituindo-os por tribunais de classe dos operários e camponeses.
Depois de o proletariado ter tomado o poder em suas mãos, ele coloca no lugar da velha fórmula ambígua “Eleição de Juízes pelo Povo” a consigna de classe “Eleição de Juízes dos meios dos Trabalhadores apenas pelos os Trabalhadores”, concretizando-a em todo o campo organizativo do sistema judiciário.
O Partido Comunista, que apenas elege no tribunal os representantes dos operários e dos camponeses que não empreguem nenhum trabalho assalariado, não tirando do trabalho assalariado portanto nenhum lucro, não estabelece nenhuma distinção relativa às mulheres.
Ele iguala em todos os direitos ambos sexos, seja na eleição de juízes seja no exercício da funções jurisdicionais (LÊNIN, 1919, p.15, APUD MÜNCHEN 2000).
  • Nesse sentido, Lênin conduz a construção de uma nova sociedade com bases no pensamento marxiano, bem como as experiências da Comuna de Paris, na medida em que forneceu substrato teórico e prático suficiente para uma nova alternativa democrática de sociedade, calcada nos alicerces populares.

  • Neste trabalho não foram abordadas demasiadamente as problemáticas das experiências desse novo modelo de justiça, mas apenas uma análise central do que foi a transição do modelo de instituição jurídico-burguesa calcada no pensamento das elites dominantes para o instituto popular alicerçado nos Soviets, soldados, trabalhadores e camponeses como uns dos modelos mais democráticos aplicados concretamente pela maioria do povo.


4.3 A CONCEPÇÃO FOUCAULTIANA DE JUSTIÇA POPULAR

  • O episódio a ser abordado neste tópico consiste no debate entre Michel Foucault e militantes maoístas sobre um projeto de tribunal popular em 1972.

  • Para Foucault (1982, p.41) em Microfísica do Poder , “A [...] hipótese é que o tribunal não é a expressão natural de justiça popular, mas, pelo contrário, tem por função histórica reduzi-la, dominá-la, sufocá-la, reinscrevendo-a no interior de instituições características do aparelho de Estado”.

  • Foucault faz um panorama histórico para fundamentar a questão do aparelho do Estado Judiciário:


Na idade média se substituiu um tribunal arbitral (a que se recorria por consentimento mútuo, para por fim a um litígio ou a uma guerra privada e que não era de modo nenhum um organismo permanente de poder) por um conjunto de instituições estáveis, específicas, intervindo de maneira autoritária e dependente do poder político (ou controlado por ele). Essa transformação apoiou-se em dois mecanismos. O primeiro foi a fiscalização da justiça: pelo procedimento das multas, das confiscações, dos sequestros de bens das custas, das gratificações de todo tipo, fazer justiça era lucrativo; depois do desmembramento do Estado carolíngio, a justiça tornou-se sobre a mão dos senhores, não só um instrumento de apropriação, um meio de coerção, mas diretamente uma fonte de riqueza; ela produzia mais um rendimento paralelo à renda feudal. As justiças eram fonte de riqueza, eram propriedades. Produziam bens que se trocavam, que circulavam, que se vendiam ou se herdavam com os feudos ou, às vezes, separados deles. As justiças faziam parte da circulação das riquezas e da extração feudal (FOUCAULT, 1982, p.42).

  • Foucault (1982) apresenta sua fundamentação a fim de deslegitimar a justiça produzida pelo modelo de tribunal arquitetado pelas classes dominantes, inclusive elucidando as contradições implantadas pelos burgueses na plebe não proletarizada e proletários com intuito de impedir revolta, e consequentemente a possibilidade do povo de se armar indo às ruas investidas de tal poder.

  • Foucault (1982) compreende a existência de três meios de mobilidade de alienação e coerção social: o exército, a colonização e a prisão. O primeiro possui a função de recrutamento de camponeses que não conseguiam trabalho na cidade. Os membros do segundo eram enviados para as colônias sem reconhecimento de trabalhador, mas sim como agentes de administração, usados como fiscalizadores e em funções de controle dos colonizados. O objetivo dessa junção era evitar a aliança desses “pequenos brancos” com os colonizados, razão pelo qual foi fomentada uma forte ideologia racista. Já o terceiro (a prisão) é a expressão do entra e sai de quem cometeu delito – delito construído como barreira ideológica – em relação aos degenerados, ladrões, enfim, a toda condição de sub-humanidade, a prisão se configura como barreira ideológica, com forte vínculo ao racismo.

  • Nesse sentido, o autor compreende a impossibilidade de alcançar uma forma justa de realizar as contradições dos populares por meio de um mecanismo das velhas formas de organização judiciária burguesa, inclusive com fortes críticas às formas espaciais dos tribunais (FOUCAULT, 1982).

  • A explanação do filósofo ocorreu durante um debate do qual participou Victor

  • (sem sobrenome), militante maoísta, cujos argumentos estão registrados em Microfísica do poder.

  • Victor rebate a arguição de Foucault levando a discussão para o plano de uma revolução proletária, tomando a China como exemplo. Explica que, num primeiro momento da revolução as massas anseiam por justiça após décadas de opressão por parte das classes despóticas. As formas de punição, num primeiro momento, aos olhos dos camponeses são consideradas atos de justiça popular. Com efeito, numa próxima fase, com o estabelecimento do Estado Proletário, constitui-se a organização de um exército popular, no caso o Exército Vermelho. Nesse período, os atos de justiça popular são embasados e disciplinados. Há uma conversão da jurisdição a um direito do povo desprendido das velhas jurisdições feudais. Na medida em que, nessa fase não impera mais um sentimento de vingança, ou uma desforra do egoísmo como elementos de opressão.

  • O militante maoísta complementa:

  • Os “vagabundos”, que eram milhões e milhões na China semi-colonial e semi-feudal, foram a base do primeiro Exército Vermelho. Os problemas ideológicos deste exército estavam ligados à ideologia mercenária destes “vagabundos”. E Mao, da base vermelha onde estava cercado, enviava apelos ao Comitê Central do Partido que diziam mais ou menos: mandemme três quadros vindos de uma fábrica para contrabalançar um pouco a ideologia mercenária com a ideologia que vem da fábrica. O Exército Vermelho sob a direção do Partido, quer dizer, a guerra camponesa sob a direção do proletariado, foi o cadinho que permitiu a fusão entre as classes camponesas em decomposição e a classe proletária (FOUCAULT, 1982, p. 58-59).

  • Ocorre que, segundo Victor, no princípio o “larápio” roubava o mais insignificante bem material, e era executado, depois que se tornou membro do Exército Vermelho, não roubou mais. Nesse sentido, há uma evolução gradativa das massas no corpo do aparelho de Estado popular (FOUCAULT, 1982).

  • Victor conclui que: “as formas da norma da justiça popular sejam renovadas, que se acabe com a mesa e a toga. Mas que permaneça uma instância de normalização. É isto que se chama tribunal popular” (FOUCAULT, 1982, p. 61).

  • Uma das características marcantes desse debate foi o consenso mútuo de que, não se deveria seguir mais o exemplo do modelo de Justiça calcado na ideologia burguesa, reiteradamente trabalhada nesta pesquisa.

  • Foucault defendeu uma nova perspectiva de justiça popular plena advinda das massas, e que o povo em determinado momento, iria “inventar” um método, não fazendo alusão temporal sobre como realizar isso; por outro lado, Victor elucida a necessidade de uma transição gradativa, com base em experiências herdadas da Ditadura do Proletariado criada por revoluções proletárias, fundadas na conduta de um aparelho de Estado de organismo popular. Logo, essas etapas são fundamentais para o amadurecimento da classe proletária e não proletária; assim se viabiliza um templo plausível de resolver suas contradições internas por anos de exploração violenta causada pelas classes dominantes (FOUCAULT, 1982).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

  • Enfim, a pesquisa demonstrou que o modelo de Poder Judiciário de Estado Liberal, no decorrer da sua evolução, demonstrou-se menos democrática em comparação com os tribunais eletivos populares.

  • A valer, tanto teóricos liberais e marxistas foram movidos a desenvolver um modelo alternativo que englobasse preceitos econômicos, jurídicos e principalmente administrativos para solucionar as contradições sociais.

  • Nesse contexto, foi possível perceber que a democracia sempre foi um privilégio de uma ínfima minoria, tendo em vista que desde a Grécia Antiga já figurava como uma relação hierárquica entre classes.

  • Lênin complementa:

“(...) Os escravos assalariados de hoje, em consequência da exploração capitalista, vivem de tal maneira acabrunhados pelas necessidades e pela miséria que nem tempo têm para se ocupar de “democracia” ou de “política”; no curso normal e pacífico das coisas, a maioria da população encontra-se afastada da vida política e social (LÊNIN, 2017, p.112)”.

  • Aliás, são características que formaram a sociedade capitalista: uma forte estrutura de sociedade burguesa consolidada e estruturada nas divisões de classes por meio da hierarquia, disciplina e subordinação aplicada, por séculos, como condição sine qua non para a consolidação da riqueza abundante das classes dominantes.

  • Ocorre que, desde os primórdios, com mais clareza nas sociedades feudais em diante, o temor que a minoria tem de imaginar a possibilidade de emancipação das massas, de elas se organizarem, de se administrarem, de se autogovernarem, bem como de ser impedido de participar ativamente da vida política e da democracia em si.

  • Na compreensão de Lênin (2017), a democracia na sociedade capitalista exclui sorrateiramente os pobres, e o Estado (conforme nomenclatura estudada) consiste numa máquina com objetivo de explorar uma classe em benefício à outra. Logo, a democracia é uma ideia, um direito permitido somente a uma minoria que tem amplo acesso e controle considerável ou pleno do Estado. Ou seja, uma democracia suprimida, de alta exclusão social.

  • Por sua vez, a democracia na sociedade socialista significa a maioria, a classe trabalhadora regendo o Estado, bem como o democratizando a todos os trabalhadores, soldados, camponeses e oprimidos. Isto é, uma democracia de inclusão, de alargamento a um maior número de pessoas num determinado território.


Ao mesmo tempo que produz uma considerável ampliação da democracia, que se torna pela primeira vez a democracia dos pobres, a do povo, e não mais apenas a gente rica, a ditadura do proletariado acarreta uma série de restrições à liberdade dos opressores, dos exploradores, dos capitalistas (LÊNIN, 2017, p.114).

  • Nesse sentido, a democracia se concretiza de forma mais ampla, contudo, não se materializa de forma plena, justamente por estar inserida num contexto de transição de um regime capitalista para um regime socialista. Lênin (2017, p.114) complementa que “a democracia para imensa maioria do povo e a repressão, pela força, da atividade dos exploradores, dos opressores do povo, ou seja, sua exclusão da democracia (...)”.

  • A democracia somente será plena quando toda resistência capitalista for destruída, e que todo senso capitalista desaparecer junto com as divisões de classes relacionadas à produção. Lênin (2017, 115), “ então é que “o Estado deixará de existir e será possível falar de liberdade”. Só então se tornará possível e será realizada uma democracia verdadeiramente completa e cuja regra não sofrerá exceção nenhuma”.

  • Essa análise é necessária justamente para embasar a compreensão da engenharia teoria e empírica marxista leninista em relação o surgimento do novo

  • Estado revolucionário operário. Esta “transição” de Estado (aparelho especial de repressão) para um Estado transitório, cujo custo benefício é bem mais em conta que todas as formas de repressão de Estado Burguês como no caso das revoltas de escravos, de servos e de todos operários assalariados (LÊNIN, 2017).

  • Foi nesse sentido que emergiu o novo Estado Operário, dos dirigentes da Revolução de Outubro composto pelos sovietes de deputados operários e soldados realizaram as reformas transitórias, que inclusive, modificaram a estrutura do “velho” modelo do Poder Judiciário construído sob o pensamento de uma minoria elitista com uma infinidade de privilégios para um Judiciário pautado por tribunais eletivos populares (MÛNCHEN, 2000).

  • Essa transição responde autores como Michel Foucault sobre a necessidade de se criar uma justiça popular.

  • Em outras palavras, a sociedade socialista é o tempo de maturação que a classe trabalhadora tem de desprender dos velhos costumes da sociedade capitalista, e consequentemente alcançar outras formas de administração da sociedade, e resultando num novo modelo de aplicação de justiça.


A partir do momento em que os próprios membros da sociedade – ou, pelo menos, a imensa maioria – tiverem aprendido a gerir por si mesmos o Estado, tiverem tomado a direção das coisas e “organizado” seu controle, tanto sobre a ínfima minoria de capitalistas como sobre os pequenos senhores desejosos de conservar seus ares de capitalistas e sobre os trabalhadores profundamente corrompidos pelo capitalismo – a partir desse momento tenderá a desaparecer a necessidade de qualquer administração. Quanto mais plena for a democracia, tanto mais próximo estará o dia em que se tornará supérflua. Quanto mais democrático for o “Estado”, constituídos por operários armados e deixando de ser “o Estado no sentido próprio da palavra”, tanto mais rápida será também a extinção de qualquer Estado (LÊNIN, 2017, p.127).

  • Portanto, a ideia foi preconizar o resgate da necessidade das massas em retomar o poder político da sociedade.

  • A transição necessária para emancipação total da sociedade até o momento incapaz de se auto-gerir por consequências de reiteradas decisões impositivas advindas das classes dominantes que sempre manipularam um complexo processo eleitoral nas democracias republicanas liberais, além de diversas decisões judiciais manipuladas pelos membros do Judiciário com interesses políticos.

  • A classe trabalhadora por direito deve se apropriar do Estado e seus apêndices, e aos poucos, o convertendo num órgão uno de trabalho, cada vez mais democratizado em alas locais viabilizando maior acessibiidade à justiça.

  • Uma ruptura do sistema republicano de Estado Burguês com a implantação gradativa da Ditadura do Proletariado sob princípio de uma nova consciência revolucionária aniquilando a exploração do homem pelo homem, elevando as formas produtivas com a queda gradativa das hierarquias sociais.

  • Um passo que só pode ser dado pelos trabalhadores, camponeses e oprimidos de forma geral. Como frisava Marx, “a emancipação dos trabalhadores serão obras dos próprios trabalhadores”.

REFERÊNCIAS

  • CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito constitucional e teoria da constituição. Ed. Coimbra: Livraria Almedina, 2011.

  • BRANCO, Pedro H. Villas Bôas Castelo. Burocracia e crise de legitimidade: a profecia de Max Weber. Lua Nova, São Paulo, n. 99, p. 47-77, Dez. 2016. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010264452016000300047&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 09 dez. 2019.

  • DAHL, Robert. A Constituição norte-americana é democrática? Ed. FGV. Rio de Janeiro, 2014.

  • EDELMAN, Bernard. A legalização da classe trabalhadora. Ed. Boitempo. São Paulo, 2016.

  • ENGELS, Friedrich, 1820 – 1895. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. Ed. Centauro. São Paulo, 2006.

  • FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir. Ed. Petrópolis, RJ, 2013.

  • ________, Michel. Microfísica do poder. Ed.Graal. Rio de Janeiro, 1982.

  • HOBBES, Thomas. Leviatã: ou matéria, forma e poder de um Estado eclesiástico e civil [e-book]. Trad. de João Paulo Monteiro e Maria Beatriz Nizza da Silva. São Paulo: Abril Cultural, 1983.

  • KELSEN, Hans. Teoria pura do direito. Ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2012.

  • LÊNIN. Vladimir Ilitch. O Estado e a revolução: a doutrina do marxismo sobre o Estado e as tarefas do proletariado na revolução. Ed. Boitempo. São Paulo, 2017.

  • MACHADO, Mário Brockmann. O Judiciário na atual estrutura constitucional. In:

  • SADEK, MT. (org.). O judiciário em debate [online]. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2010, p. 80-109. Disponível em: <http://books.scielo. org>.

  • MARAVALL, José Maria. The rule of law as political weapon. In: PRZEWORSKI, Adam. MARAVALL; José Maria (Org.). Democracy and the rule of law. Cambridge: Cambridge Universty Press, 2003.

  • MARX, Karl, 1818-1883. O 18 de Brumário de Luís Bonaparte. Ed. Boitempo. São Paulo, 2011b.

  • ____. A Guerra Civil na França. Ed. Boitempo. São Paulo, 2011a.

  • ____. A ideologia alemã. Ed. Boitempo. São Paulo, 2007.

  • ____. Miséria da Filosofia. Ed. Boitempo. São Paulo, 2017.

  • ____. Crítica do Programa de Gotha. Ed. Boitempo, 2012.

  • ____. Manifesto Comunista. Ed. Boitempo, 2010.

  • ____. Para a crítica da Economia Política (Prefácio). Trad. de José Barata-Moura. Lisboa: Ed. Progresso, 1982. Disponível em: <https://www.marxists.org/portugues/ marx/1859/01/prefacio.htm>. Acesso em: 27 nov. 2019.

  • MONTESQUIEU, Baron de. O espírito das leis. Trad. de Cristina Murachco. São Paulo: Martins Fontes, 2000. Disponível em: <https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.

  • php/2963710/mod_resource/content/0/Montesquieu-O-espirito-dasleis_completo.pdf>.

  • MÜNCHE, Emil Asturig Von. O Poder Judiciário no estado burguês e a perspectiva dos tribunais da Revolução de Outubro: pequenos ensaios sobre o Marxismo e Direito, Sociedade e Estado na Revolução. Disponível em:

  • <http://www.scientific-socialism.de/PECAPIntrod.htm>. Acesso em: 27 nov. 2019.

  • ROUSSEAU, Jean-Jacques. Do contrato social ou princípios do direito político. Ed.Penguin Classics Companhia das Letras, 2011.

  • TROTSKY, Leon. A revolução traída. Ed. Global. São Paulo, 1980.

  • [1] Comitê Político (PAC) recebimento de doações de pessoas físicas e jurídicas com objetivo de campanhas eleitorais sem limite legal, contanto que informe o nome dos doadores, tal como não esteja vinculado de modo direito à campanha. [2] Os outros são: a legitimação do escravismo pós-Guerra Civil, especialmente na figura das pessoas condenadas por crimes; o sistema legislativo bicameral que favorece oligarquias dos estados menores; até 1913, as eleições indiretas nas assembleias estaduais para senadores; os estados tinham direito a inquestionabilidade sobre leis decretadas perante o Congresso (DAHL, 2014).

1.509 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page