Moscou 1941 – O Início da Vitória

João Claudio Platenik Pitillo
Pesquisador do NUCLEAS/UERJ
Especialista em Segunda Guerra Mundial
Doutorando em História Social
Os nazistas denominaram “Operação Tufão” *a conquista da capital da URSS e o aniquilamento dos Exércitos de Konev e Yeremenko, que comandavam respectivamente a Frente Ocidental e a Frente de Bryansk**.
A resistência que as tropas soviéticas ofereceram aos nazistas e à sua guerra-relâmpago na cidade de Smolensk*** em agosto de 1941 gerou um desgaste fundamental para dar tempo que as defesas de Moscou pudessem ser reforçadas, já que o avanço nazista, mesmo que custoso as suas tropas, não se detinha. Com isso o perigo de queda da capital da URSS já era sentido pelo governo soviético em setembro.
A ofensiva alemã contra Moscou contou com duas fases. A 1a foi de 30 de setembro a 30 de outubro e a 2a foi de 15 de novembro a 5 de dezembro de 1941. Para tanto, o Comando alemão mandou para essa missão os blindados (Panzers) dos generais Guderian, Hoth e Hoeppner que eram apoiados pelos Comandantes Chefes Leeb, Bock e Rundstedt e seus Grupos de Exércitos.
A 2 de Outubro o ataque principal começou com uma força tão avassaladora que conseguiu tomar Orel e reter o 3o , 13o e 50o Exércitos de Yeremenko****, mais a frente no dia 6 era a vez de Koniev***** quase ser cercado e aniquilado. Ao todo o Grupo de Exército Centro Alemão utilizaram mais de 1.000.000 de homens, 1.700 blindados e canhões de assalto e mais de 19.000 canhões e morteiros apoiados por grande número de aeronaves1.
O avanço violento dos nazistas rompeu as defesas da Frente Ocidental e a Frente de Reserva. Com isso a cidade de Tula passou a ser perigosamente ameaçada depois da captura de Orel. A 6 de outubro os invasores transferiram todo seu poder de ataque de Leningrado para Moscou, deixaram um cerco de artilharia sitiando a referida cidade.
Nesse momento a população moscovita começou uma grande mobilização para construir vários quilômetros de defesas antitanques e anti-pessoal.
A população moscovita foi muito firme, já que em nenhum momento deixou o pânico possuir a sua cidade. O crédito dessa organização pode ser dado também ao Partido Comunista da URSS.
Nos dias 8 e 9, os jornais moscovitas começaram a noticiar que o inimigo estava muito próximo e que parecia inevitável que os combates começassem nos arredores dos subúrbios de Moscou dentro de alguns dias. A situação era tão crítica que uma comissão do Comitê Estatal de Defesa formado por Voroshilov, Malenkov e Molotov foi para o Q.G.* da Frente Ocidental no dia 10 para analisar a situação, lembrando que Jukov** havia sido nomeado comandante da mesma no dia anterior.
Nos dias 12 e 13 algumas repartições públicas e alguns organismos estatais foram evacuados, porém sem alarmismo ou desespero. A população continuava a agir de forma centrada, todos trabalhando e a vida moscovita a pleno vapor, teatros, bares e cinemas funcionando normalmente, exceto na hora dos apagões. Nos dias 14 e 15 grandes quantidades de tropas motorizadas e blindadas das hordas nazistas avançaram sobre as tropas soviéticas. As tropas de reservas soviéticas foram enviadas para tentar reconstruir a Frente Ocidental.
As defesas em profundidade que os soviéticos organizaram dependiam muito das reservas provenientes da Ásia e como havia ameaças nos quatro lados de suas fronteiras, ficava cada vez mais complicado retirar tropas de algum lugar. A formação e a equipagem de novas divisões não estavam correspondendo aos números de perdas.
Nesse momento o PCUS*** começou a organizar operários, camponeses e jovens de todas as áreas para integrar as Forças Armadas em maiores quantidades, mostrando que a pátria corria sério risco e que os Aliados Ocidentais pouco poderiam fazer para deter Hitler e seus satélites.
Esse chamado foi respondido de imediato. Os batalhões operários ganharam corpo com maior ênfase e começaram a marchar para frente de combate. Os jovens alistaram-se em massa, e as mulheres, no primeiro momento inundaram as fábricas para dirigir toda a produção para frente de batalha.
Somente em outubro e novembro de 1941 os operários de Moscou forneceram à Frente 5 divisões de reforços. Ao todo, desde o começo da guerra os moscovitas haviam formado 17 divisões, fora as tropas voluntárias que se organizaram em centenas de destacamentos de infantaria e de caça-tanques, visando a defesa da cidade. 17.000 mulheres foram treinadas para o serviço de saúde.
Ao final de outubro, cerca de 2.000.000 de habitantes tinham sido evacuados de Moscou. Mesmo assim, as fábricas e o comércio continuaram funcionando, como escolas e demais organismos estatais. A direção central do PCUS e os dirigentes de Estado continuaram na capital como prova de determinação e coragem.
Essa mobilização construiu 1.428 ninhos de canhões e metralhadoras, 160 quilômetros de valas antitanques, 122 quilômetros de pistas com dentes de dragão, cavalos de frisas, além de minas e arames de tropeço, tudo isso construído por mais de 100.000 moscovitas, na sua grande maioria mulheres que trabalharam debaixo de uma terrível nevasca1.
No final de Outubro os soviéticos lançaram um duro contra-ataque que conseguiu deter os nazistas. Eles tiveram que reagrupar e organizar uma nova ofensiva, o que levou pelo menos 15 dias. Nesse momento, o governo soviético preparou a festa da revolução. No dia 7 de novembro, uma semana do esmorecimento da primeira grande investida contra Moscou, o governo soviético organizou uma grande parada militar para comemorar o 24o aniversário da revolução. A população compareceu em massa e ajudou a aplacar o sentimento de cerco que vinham sentido.
No mês de novembro os hitleristas continuaram avançando lentamente. O número de mortos dos dois lados era estrondoso. Com isso os alemães tomaram Rostov* e a 2 de dezembro desfecharam o maior e mais violento golpe contra as defesas soviéticas. Os nazistas tinham como ponta de lança o 2o Exército Panzer, que não conseguiu quebrar as defesas soviéticas. Com isso, as pinças alemãs foram detidas pelas torqueses soviéticas.
A capacidade defensiva da URSS naquele momento foi tão extraordinária que a 5 de dezembro os nazistas perderam o ímpeto em todas as Frentes, isso acerca de 30 quilômetros de Moscou. Uma combinação de armas antitanques, artilharia e tropas bem treinadas e dispostas, conseguiram parar o avanço hitlerista antes de alcançarem a capital soviética.
No início de dezembro as duas poderosas ofensivas da “Operação Tufão” não tinham conseguido tomar Moscou, as tropas hitleristas estavam exauridas e com graves problemas de logística. O Alto Comando nazista não acreditava que a resistência soviética seria tão grande e duradoura. Com isso os nazistas não foram preparados para um inverno na defensiva.
Foi assim que a partir da primeira semana de dezembro, o Exército Soviético começou a desenrolar o seu contra-ataque, com tropas melhores equipadas e treinadas para o novo contexto de guerra. O Alto Comando Soviético começou a organizar várias frentes que visavam expulsar os invasores de Moscou e retomar o contato com Leningrado. Para isso os novos T-34* e as armas antitanques que os soviéticos desenvolveram em larga escala tiveram um papel preponderante.
Os contra-ataques soviéticos recuperaram Kalinim, Rzhev, Kaluga, Kerch e várias outras cidades menores, além de terem rechaçado os hitleristas para até 300 quilômetros de Moscou. Nesse contexto o Exército Vermelho pode se organizar com mais calma e planejar os próximos passos a partir de uma defesa ativa, onde os recuos já tinham virado coisa do passado.
Com a vitória do Exército Vermelho em janeiro de 1942 a história na Frente Leste passou a ser escrita pelos combatentes soviéticos.
*16 de setembro de 1941, Hitler expede uma diretiva com o objetivo de cercar e esmagar Moscou, como foi feito na Ucrânia.
** Principais forças soviéticas naquele momento.
*** Importante cidade que fica a cerca de 360 km de Moscou.
**** Andrei Ivanovich Yeremenko foi Comandante da Frente Ocidental (1941), da Frente de Stalingrado (1942/1943) e da Frente Ucraniana (1945).
***** Iván Stepanovich Koniev comandou o 19o Exército, teve atuação destacada na defesa de Moscou.
1 JUKES, Geoffrey. A Defesa de Moscou, Rio de Janeiro, Editora Renes, 1975.
*Quartel General.
** Na língua portuguesa a pronúncia deve ser com “j” e não “z”, que é usado pelo inglês quando na tradução do russo.
*** Partido Comunista da União Soviética.
1 JUKES, Geoffrey. A Defesa de Moscou, Rio de Janeiro, Editora Renes, 1975. P. 105.
*Cidade considerada o portão de entrada do Cáucaso.
* “Tanko-34” – Blindado médio soviético. Desenvolvido entre 1943 e 1944, armados com canhões de 76 e 85 mm tornara-se o “cavalo de batalha” soviético, pela combinação de velocidade, força, confiabilidade e blindagem.