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O SOCIALISMO E A LIBERTAÇÃO HUMANA: REVIVER AS IDEIAS DE MARX É LUTAR PELO NOVO MUNDO


Por Filipe Henrique


Introdução:


O marxismo no final do século passado foi reduzido politicamente a uma derrota, uma experiência que não se concretizou pela simples “natureza humana” transformando o socialismo em uma utopia que buscava a igualdade entre os seres vivos sem se importar com o sagrado individuo escravizado pelo consumo desenfreado e pelo desejo quase instintivo pela propriedade privada.


Marx então foi transformado de pensador profético a teórico do fracasso. O murro de Berlim caia sobre os sonhos comunistas de todo o mundo, o fim da União Soviética foi a confirmação do inevitável. A pátria dos trabalhadores sucumbia ao revisionismo iniciado por Nikita Khrushchov.


Mesmo que uma certa tentativa de renovação do socialismo cientifico já fosse tentada na década de 1970, a ressureição acadêmica do marxismo só iria acontecer na metade da década de 1990, nas mãos de autores desalinhados do processo soviético, mesmo que alguns ainda considerassem o leninismo a continuação teórica e pratica do marxismo.

Poderia citar diversos autores responsáveis por essa nova roupagem das ideias de Marx, István Mészáros, Antonio Negri, Alain Badiou, Domenico Losurdo, Carlos Nelson Coutinho a exemplo do Brasil


Os setores trotskistas também tentaram renovar o marxismo, acusando todas as experiências do chamado socialismo real de stalinismo, tentando voltar aos escritos de Marx e Lenin que supostamente teriam sido contaminados teoricamente por Josef Stalin e os demais dirigentes do partido comunista.


Essa luta para renovar a tradição marxista acabou por dar espaço a um ataque no campo da filosofia. O materialismo dialético acabou por ter sua relevância superada, toda a esquerda quando recorria a filosofia não falava mais em Marx ou Engels, falavam de Kant, Descartes, Rousseau, apelavam a razão contra os fenômenos reacionários. O capitalismo, o imperialismo, a exploração selvagem pareciam ter sido extintos da sociedade, mesmo que a divisão de seres entre classes não.


É preciso retomar a perspectiva materialista da existência e trazer ao debate as questões que rondavam o mundo de 1917 a 1991, despertando o horror dos donos do mundo, e que ainda influenciam países como Cuba, Coreia Popular, Vietnã, Laos, e China.


Não pretendo conceber um trabalho definitivo, o que quero é fazer um esforço intelectual e trazer alguns fatores, um em especifico, para o debate de ideais.


Não pretendo refutar nenhum dos autores citados, a questão aqui analisada deve ser debatida e questionada a exaustão.


A libertação humana ultrapassa os limites intelectuais de um simples trabalho. Enfim, com esta brevíssima introdução apresentada, desejo ao ilustríssimo leitor uma boa experiência e peço que leia com atenção e se possível questione cada linha apresentada.


Critica a metafisica:


O conceito metafisica surgiu quando o filósofo grego Andrónico de Rodes decidiu organizar a obra de seu já falecido professor Aristóteles escrita no século IV a.c. A metafisica tinha como objetivo refutar os filósofos pré- socráticos, como por exemplo, Tales de Mileto e Diógenes (aliás, dos pré- socráticos Diógenes é o meu preferido).


Aristóteles entendia que a ideia de uma natureza como um elemento físico como a terra, o fogo, a agua e o ar seria limitada para uma verdadeira compreensão filosófica de mundo.


Em suas próprias palavras:


A maioria dos primeiros filósofos concebeu apenas princípios materiais para todas as coisas. Aquilo que todas as coisas consistem, de que procedem primordialmente, e para o que, por ocasião de sua destruição, são dissolvidas em última instancia. Permanecendo a essência, ainda que modificada por suas afecções, isso, dizem, é um elemento em principio das coisas existentes.


A metafisica de Aristóteles foi criada para combater a materialidade da existência contida nos primeiros filósofos, seus objetivos eram fazer da ciência mortal igualada a ciência divina e entender o mundo por ela, pelo não materialismo. Essa característica provocou muitas tensões entre marxistas e metafísicos.


Martin Heidegger em uma entrevista concedida no ano de 1969 fez duras críticas a Marx, baseando seu argumento no seguinte trecho da obra teses sobre Feuerbach:


Os filósofos limitaram-se a interpretar o mundo de diversas maneiras; mas o que importa é modifica-lo.


Heidegger disse que Marx baseava-se em uma certa interpretação de mundo, para a partir disso fazer a mudança, e por isso sua sentença seria sem fundamento e até anti-filosófica.

Heidegger não leva em conta que Marx revive em seu materialismo, a materialidade da existência contida na obra dos primeiros filósofos e que Aristóteles renegou como insuficiente para entender o mundo. Os fenômenos da natureza segundo os pré-socráticos, vira em Marx os fenômenos sociais do capitalismo.


Ele também acusa Marx de propor a mudança por uma certa interpretação de mundo, mas também se esquece que a base do materialismo dialético são os fenômenos da sociedade que levam a uma situação revolucionaria, sendo assim, não há uma interpretação exata para fazer a mudança de uma sociedade capitalista para uma sociedade socialista, isso dependeria da realidade em cada tempo histórico, sendo assim , a sentença marxista não seria então sem fundamento, pois sua pratica não depende de uma interpretação dogmática de cada realidade.


Alguns outros defensores da metafisica como Richard Rorty, conhecido como o filosofo que esteve em guerra com a filosofia por toda sua vida, dizia que os metafísicos pensam que o ser humano por natureza deseja pensar, podem pensar em questionar coisas como seu vocabulário, e que seu senso comum fornece-lhes a imagem do saber, e que a metafisica podem lhes proporcionar essências reais, e que os metafísicos devem ajudar a descobrir essa essência do saber.


Mao já dizia em seu texto sobre a pratica que “o conceito da verdade não pode ser outro se não o da pratica social” sendo assim em um sistema onde o fetiche pela mercadoria, onde a exploração da mais valia, onde a alienação do trabalho exista, pode-se falar que o pensar está em mãos da classe dominante por meio veículos de comunicação entre outras formas de dominação intelectual, então como a essa elevação da consciência sem a materialidade da existência?


Os métodos idealistas dos metafísicos estão descolados da realidade concreta da existência, a pratica do livre pensamento, do senso do saber, e da liberdade real da experiência enquanto sua essência depende de uma ruptura ideológica na sociedade, e sobretudo, uma ruptura na vida material do ser humano, não existe conhecimento enquanto houver a relação de servidão entre espécie humana.


A crise do capital, e uma nova era para Marx:


A sociedade capitalista vive sua pior crise em quase cem anos, o desemprego, a fome e a miséria assolam a sociedade aberta. As possibilidades do capitalismo enquanto sistema individual estão sendo ameaçadas pela experiência real dos trabalhadores de todo o mundo. Com isso ganha protagonismo uma das últimas experiências do socialismo real, a China.


Com sua ascensão os valores tradicionais da democracia burguesa começam a ser questionados, principalmente no campo econômico, mas também pode ser questionada no campo filosófico.


A complexidade produtiva do capitalismo sempre foi uma das mais recorrentes argumentações adotadas como elogio ao sistema, a democratização de ideias fazia parte desse argumento.


No entanto, o autoritarismo da sociedade aberta se manifesta por um inimigo já conhecido, o fascismo. O crescimento da extrema direita no mundo é alarmante, o fascismo é a demonstração do capitalismo em sua essência mais brutal.


Com esse fenômeno do sistema que busca proteger como filhos os membros da atual classe dominante (a burguesia) a esquerda foi obrigada a retomar um projeto político, mas também filosófico que não se prenda mais a defesa de uma democracia moderada e nem, no campo das ideias, com a simples razão contra a barbárie.


O aumento de representantes de pôr um projeto que visa uma saída socialista para a crise fascista, também dá espaço a base filosófica seguida pelo materialismo marxista renegado pelos intelectuais após a queda da União Soviética, pode voltar ao debate renovado para atual calamidade.


E como mostrado na crítica aos metafísicos, não se pode mais conceber a existência, nem a questão filosófica de mundo, sem antes lutar pela modificação da estrutura de nossa civilização.


Nenhum pensador moderno pode se dar ao luxo de não pensar na estrutura atual para desenvolver suas reflexões. Insistir em não buscar uma solução pratica se prova anacrônico neste momento de questionamento das relações no capitalismo.


A materialidade da existência (já citada no texto) é inquestionável perante o acirramento da luta de classes que se desenvolve de forma letal em todo mundo, é hora de olhar novamente para classe trabalhadora e para sua revolução como a locomotiva da história.

O fracasso da burguesia é o mesmo fracasso de outros dominadores (a igreja, o feudalismo, a monarquia, o império, etc.). Os comunistas devem se aproveitar da atual conjuntura e tentar renovar o marxismo para os novos tempos.


Tentar deslumbrar um futuro pós capitalista é necessário para a luta progressista e para a superação da crise política e também para um verdadeiro questionamento da realidade pondo a filosofia como central para a nova sociedade, ao invés de inteiramente livre da pratica.


A cerca da libertação:


Muito se falou de renovação até agora, muito se criticou e muito se falou do materialismo como o melhor meio de compreender as contradições filosóficas do mundo moderno. Agora podemos começar a deslumbrar o que seria essa ideia que dá título ao texto, o que seria a libertação humana por um viés marxista-leninista?


O marxismo-leninismo é a junção da contribuição teórica de Marx, Engels e Lenin na organização partidária e na construção revolucionaria do socialismo e posteriormente do comunismo. Porém, a questão da libertação humana foi já discutida por inúmeros marxistas (da linha leninista).


Para essa questão teremos que refletir primeiro o que seria o conceito de libertação? Esse conceito é antagônico entre liberais (capitalistas) e socialistas (marxistas). O capitalista entende como liberdade o direito de escolha pela propriedade privada dos meios de produção, o que seria isso? Seria o direito de ampliação da propriedade, o livre mercado, por tanto, uma liberdade limitada aos proprietários.


Mas e os que vendem sua força de trabalho para sobreviver? Sua liberdade é anulada por não ter propriedades? Bem, desde cedo somos ensinados que somos livres, afinal podemos escolher que ideologia seguir, como se vestir, para onde ir, tudo isso são representações de nossa livre escolha, certo? Não é bem assim.


O professor José Paulo Netto em sua palestra: introdução ao método de Marx (disponível no YouTube) demonstra bem qual diferença entre a liberdade para Marx e a liberdade para os capitalistas.


Para Marx a verdadeira liberdade é a possibilidade de escolher entre alternativas concretas, por exemplo: nas nossas férias o modelo neoliberal vigente nos dá uma alternativa de viajar para outro pais, como a França, mas não nos dá a condição material para que possamos faze-lo quando bem entendermos.


Outro exemplo: se você é da classe trabalhadora e quer seguir carreira acadêmica ou artística o capitalismo lhe dá essa possibilidade, mas não lhe dá a segurança de emprego e de vida digna para seguir este desejo.


Logo estas duas alternativas estão anuladas para a grande maioria (classe trabalhadora) por uma questão de sobrevivência, logo, a liberdade apresentada é limitada pela questão material e não pela meritocracia como nos vendem.


Nas concepções de Ernesto Che Guevara a libertação marxista exigiria um inversão de valores do ser. Os valores capitalistas como o egoísmo, a ganancia, não caberiam na transição para socialismo, na construção desse período histórico.


Nas palavras de Che:

A nova sociedade em formação deve competir muito duramente com o passado. Isto se faz sentir não apenas na consciência individual, na qual pensam os resíduos de uma educação sistematicamente orientada para o isolamento do indivíduo, mas também pelo próprio caráter desse período de transição, onde permanecem as relações mercantis.


Esta análise de Che pode ser encarada como o projeto de novo homem soviético encabeçado pelos revolucionários de 1917 e posteriormente abandonado pelos revisionistas do XX congresso em 1956, onde ocorreu o chamado relatório secreto com rasteiras difamações Josef Stalin e a toda a construção complexa do socialismo na Rússia.

O que seria o novo homem soviético? Nas palavras de Lenin:

O proposito principal de treinar, educar e ensinar os jovens de jovens de hoje deve ser de embuti-los com a ética comunista.


Isso nos remete a ideia de Guevara para construir o homem novo, sua educação deve atender aos interesses de sua classe e não aos interesses burgueses, o seu humanismo deve ser quase que um reflexo involuntário, o espirito de sacrifício para dar a construção socialista seu significado mais pleno; o de libertação.


Bibliografia:


Metafisica - Aristóteles (14 volumes, século IV A.C)

O socialismo e o homem em Cuba - Guevara, Ernesto (Nova Cultura, 2021)

Collected Works, Lenin, Vladimir (volume 31,1920)

Ironia e ceticismo - Del Forno, Ricardo (editorafi)

Teses sobre Feuerbach - Marx, Karl (1888)

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